Vamos analisar neste estudo a questão semântica, conceitual e ideológica que envolve as siglas APS, ABS e ESF.
Antes de qualquer descrição sistemática da Estratégia Saúde da Família (ESF), seria prudente categorizar o conceito em que essa atividade se localiza, a Atenção Primária da Saúde (APS).
Veja na animação a seguir os diferentes significados do termo Atenção Primária da Saúde.
Tudo bem! Mas o que é APS, afinal?
A APS não tem um sentido único. Várias apropriações, usos e sentidos têm sido utilizados, tanto por forças conservadoras quanto por forças progressistas.
Toda concepção saúde/doença tem uma ação consequente.
Toda atenção (ou cuidado) em saúde expressa uma concepção saúde/doença.
Esse aforismo se aplica muito bem à APS e a qualquer conjunto de conhecimentos e práticas na área da saúde.
As forças conservadoras estão preocupadas com o custo do setor saúde e enxergam a APS como a possibilidade de barateá-lo.
As forças progressistas estão ocupadas com as desigualdades sanitárias e a possibilidade de construir cidadania pelo enfoque da saúde.
Classicamente, reconhece-se que o Relatório Dawson de 1920, Grã-Bretanha, carrega em sua estrutura uma sistematização do conceito de APS. O texto deve ser relativizado e contextualizado no seu tempo, mas é impressionante notar certas semelhanças com o que, contemporaneamente, está sendo discutido.
Sir Dawson dividiu um sistema de saúde em três níveis:
Primário – composto por generalistas em comunidades;
Secundário – com especialistas atuando em ambulatórios;
Terciário – com especialistas vinculados à atenção hospitalar.
Naquela época, Dawson já caracterizava a APS a partir da delimitação de um Distrito, com a atenção baseada em necessidades locais, desenvolvida por um médico generalista que promoveria ações de prevenção de doenças e recuperação da saúde.
A base territorial, a relação entre os níveis de atenção, a integração das concepções curativista e preventivista fundamentaram as discussões na formação de vários sistemas de saúde.
Um dos marcos históricos mais importantes foi, sem dúvida, a I Conferência Nacional de Cuidados Primários de Saúde, ocorrida em Alma-Ata (Cazaquistão), em 1978.
ATENÇÃO: Consideramos leitura obrigatória o relatório final da Conferência de Alma Ata, tanto pela sua relativa atualidade quanto por sua importância histórica. A base territorial de adscrição populacional, a participação social, a educação, a intersetorialidade, os medicamentos essenciais, o trabalho em equipe, entre outros elementos, são abordados no documento.
Os pressupostos contidos nesse documento indicam uma filiação formal aos princípios do que chamamos Atenção Primária Ampliada. Outra aproximação teórica possível é com o conceito de Atenção Primária Orientada na Comunidade, desenvolvido por Starfield (2002)
Mas o que é APS ampliada?
É uma atenção essencial à saúde baseada em tecnologia e métodos práticos, cientificamente comprovados e socialmente aceitáveis, tornados universalmente acessíveis a indivíduos e famílias na comunidade por meios aceitáveis para eles e a um custo que tanto a comunidade como o país possa arcar em cada estágio de seu desenvolvimento, um espírito de autoconfiança e autodeterminação.
É parte integral do sistema de saúde do país, do qual é função central, sendo o enfoque principal do desenvolvimento social e econômico global da comunidade.
É o primeiro nível de contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, levando a atenção à saúde o mais próximo possível do local onde as pessoas vivem e trabalham, constituindo o primeiro elemento de um processo de atenção continuada à saúde. (OMS, 1978).
Existe uma APS que não seja ampliada ou orientada para a comunidade? Existe!
A imagem de APS está intrinsecamente relacionada com aqueles princípios que entendem saúde/doença como processo determinado socialmente. Não nega os condicionantes ecológico-ambientais, mas entende-os como hierarquicamente subordinados à forma como nossa sociedade se organiza. Tampouco nega os desencadeadores etiológicos, mas situam-nos como componentes dos condicionantes e esses como servis do determinante social.
Há outras formas de pensar APS? Existem, por exemplo:
APS Seletiva: caracteriza-se basicamente por programas de impacto a comunidades específicas. Um exemplo poderia ser o Programa de Terapia de Reidratação Oral em região com alta mortalidade por doença diarreica. Também seria considerada APS seletiva um programa de Saúde Indígena.
APS Clássica: é apenas como um nível de atenção, baseado em prevalência, centrado no atendimento clínico, ou seja, centrado nas doenças mais comuns, no indivíduo e na figura do médico.
Neste estudo, proporcionamos a você a possibilidade de fazer uma reflexão crítica sobre as diferentes formas de pensar a APS. Você conseguiu perceber as relações semânticas com as questões ideológicas intrínsecas no conceito de APS? Então atingiu o objetivo deste estudo.
Para finalizar o estudo, resolva a autoavaliação disponibilizada a seguir:
