Módulo 8: Clínica da Atenção Psicossocial
Unidade 1: Psicopatologia dos transtornos mentais

Psicopatologia do sofrimento psíquico e dos transtornos mentais
Diagnósticos no contexto da Reforma Psiquiátrica
Acolhimento e diagnóstico ampliado no campo da atenção psicossocial
A contribuição do exame do estado psíquico às síndromes psicossociais
Principais síndromes na prática clínica

C-A-S-O-M-I-A-P-C-L

Clique e confira as Quadro Funções psíquicas segundo Dalgalarrondo (2008).

Consciência
É o estado de lucidez em que a pessoa se encontra. Inclui o reconhecimento da realidade externa ou de si mesmo em determinado momento e a capacidade de responder a estímulos.
  • Vigilância: estado de estar desperto, acordado, vígil, lúcido.
  • Obnubilação: alteração na capacidade de pensar com clareza e com a rapidez costumeira; de perceber, de recordar e responder aos estímulos habituais.
  • Estupor: inibição motora que se manifesta por imobilidade do corpo e da face, com mutismo mais ou menos acentuado.
  • Coma: abolição completa da consciência, não pode ser acordado.
Atenção
Capacidade para centrar-se em uma atividade. O seu exame envolve observar: a vigilância, a tenacidade e a concentração.
  • Vigilância: compreende a manutenção de um foco de atenção para estímulos externos. Pode estar aumentada (hipervigilante) ou diminuída (hipovigilante).
  • Tenacidade: capacidade de manter-se em uma tarefa específica.
  • Concentração: capacidade de manter a atenção voluntária, em processos internos de pensamento ou em alguma atividade mental.
Sensopercepção
É a capacidade de perceber e interpretar os estímulos que se apresentam aos órgãos dos cinco sentidos. Quando alterada, pode manifestar-se através de:
  • Ilusões: ocorrem quando os estímulos sensoriais reais são confundidos ou interpretados erroneamente. Ex.: confundir a imagem de uma pessoa com outra.
  • Alucinações: ocorrem quando há percepção sensorial na ausência de estímulo externo (percepção sem objeto). Ex.: ouvir vozes sem que haja estímulo auditivo. Obs.: Estar atento a sinais sugestivos de alucinações, mesmo quando o usuário as nega.
  • Despersonalização: alteração na percepção de si próprio, manifestada por sentimentos de estranheza ou irrealidade.
  • Desrealização: alteração na percepção do meio ambiente.
Orientação
Avalie
  • Orientação autopsíquica, em relação à pessoa: Pergunte a respeito de seus dados pessoais e investigue se reconhece familiares e as pessoas com as quais está em contato.
  • Orientação alopsíquica: orientação quanto a tempo e espaço.
Memória
Capacidade de registrar, fixar ou reter, evocar e reconhecer objetos, pessoas, experiências ou estímulos sensoriais. Sua análise engloba a avaliação das memórias: imediata, recente e remota.
  • Memória imediata: capacidade de reter a informação imediatamente após ser percebida. Confundida com a atenção. Pode ser verificada pela repetição de palavras ou números enunciados pelo entrevistador.
  • Memória recente: capacidade de reter a informação por um período curto de tempo. Engloba as últimas horas e dias. Verificada através da indagação de fatos recentes da vida do usuário que possam ser objetivamente comprovados.
  • Memória remota: capacidade de evocação de informações e acontecimentos ocorridos no passado, após meses ou anos do evento.
Capacidade intelectual
Conjunto de habilidades cognitivas resultante dos diferentes processos intelectivos. Inclui raciocínio, planejamento, resolução de problemas, pensamento abstrato, compreensão de ideias complexas, aprendizagem rápida e aprendizagem a partir da experiência.

Para avaliação, utiliza-se de comparação com a média esperada para o grupo sociocultural e para a faixa etária do indivíduo. Avalie:
  • Raciocínio lógico.
  • Capacidade de fazer contas.
  • Dificuldades em estudar.
  • Capacidade de abstração: capacidade de formular conceitos e ideias, compará-los, relacioná-los. Observe se o usuário recorre a analogias e metáforas. (pode ser avaliada a compreensão de provérbios).
  • Capacidade de generalização: perguntar sobre grupos de coisas, animais
Humor
É o estado emocional de longa duração, interno, que não dependente de estímulos externos e que o usuário percebe em si mesmo. É a tonalidade de sentimento predominante. Pode influenciar a percepção de si e do mundo ao seu redor.
Afeto
É a experiência imediata e subjetiva das emoções sentidas em relação à situação. Percebida pelo entrevistador. Inclui a manifestação externa da resposta emocional do usuário a eventos da vida. Avalia-se o afeto pela expressão facial, gestos, tonalidade afetiva da voz, conteúdo do discurso e psicomotricidade, choro fácil, risos imotivados, entre outros.

Avalie:
  • Qualidade do afeto: culpa, alegria, vergonha, afeto depressivo, entre outros.
  • Modulação do afeto: é a variação do afeto e pode adequar-se ou não à situação existencial.
  • Exemplos: normomodulação, hipermodulação, hipomodulação, embotamento e rigidez.
  • Tonalidade afetiva (quantidade e carga afetiva): hipotimia (sintomas depressivos), hipertimia (euforia), disforia (tonalidade afetiva desagradável, mal-humorada), entre outros.
  • Equivalentes orgânicos: devem ser avaliadas as alterações do apetite, peso, sono e libido (inclui a sexual).
Pensamento
Conjunto de funções integrativas capazes de associar conhecimentos novos e antigos, integrar estímulos externos e internos, analisar, abstrair, julgar, concluir, sintetizar e criar. O pensamento é avaliado, por meio da linguagem, nos seguintes aspectos:
  • Forma: relação e nexo das ideias entre si. Avalie:
    • Coerência: construção das frases em relação à sintaxe.
    • Logicidade: pensamento fundado na realidade.
    • Circunstancialidade: alteração na qual há expressão do pensamento por meio de detalhes irrelevantes e redundantes, porém o usuário consegue chegar ao objetivo.
    • Tangencialidade: o objetivo nunca é alcançado, ou não é claramente definido, embora o usuário fique sempre próximo ao que seria sua meta.
  • Fuga de ideias: associações tênues ou livres.
  • Fluxo: velocidade com que as ideias passam pelo pensamento (acelerado, lentificado, adequado, ou bloqueado).
  • Conteúdo: Neste item, investigam-se os conceitos emitidos pelo usuário e sua relação com a realidade. Avalie:
    • Conteúdo predominante:
    • preocupações
    • obsessões
    • ideação suicida ou homicida
    • presença de delírios (falsa crença, não compartilhada por membros do grupo sociocultural). Nesses casos, deve ser elucidado o conteúdo do delírio.
Conduta
Psicomotricidade: Integração das funções motrizes e mentais sob o efeito da educação e do desenvolvimento do sistema nervoso. Avalie:
  • Velocidade e intensidade da mobilidade geral na marcha, quando sentado e na gesticulação.
  • Agitação ou retardo.
  • Acatisia: inquietação intensa, movimentos nos pés tipo de “amassar barro”.
  • Maneirismos: movimentos involuntários estereotipados, caracterizados por serem bizarros e repetitivos.
  • Tiques: movimentos involuntários e espasmódicos, atos coordenados, repetitivos, resultante de contrações súbitas, breves e intermitentes.
  • Apraxia: impossibilidade de realizar atos intencionais, gestos complexos, voluntários.
Linguagem
É o modo de se comunicar. Envolve linguagem verbal, gestos, olhar, expressão facial e escrita. A linguagem falada é o principal ponto de observação.
  • Quantidade: pode demonstrar um indivíduo em mutismo, monossilábico, prolixo, não espontâneo, entre outros.
  • Velocidade: pode ser rápida, lenta, hesitante, o indivíduo pode demonstrar latência para iniciar respostas.
  • Qualidade: conteúdo do discurso (pobre, elaborado), alterações na articulação das palavras, neologismo (criação de novas palavras), ecolalia (repetição da última ou das últimas palavras dirigidas ao usuário).
  • Volume: alto ou baixo.

A partir de Dalgalarrondo (2008) e Stefanelli et al. (2008), podemos resumir as funções psíquicas e suas alterações em:

a) Consciência:
Estados: vígil – desperto – obnubilado – torporoso – de coma.

b) Atenção:
Normotenacidade – hipotenacidade – hipervigilância.

c) Sensopercepção:
Normalidade – ilusão - pseudoalucinação – alucinação.

d) Orientação

e) Memória:
Fixação: inalterada – alterada
Evocação: inalterada – alterada – hipermnésia - hipomnésia

f) Inteligência:
Compatível ao grau de instrução - incompatível ao grau de instrução - retardo mental.

g) Afeto:
Depressivo – eufórico – irritado – exaltado – pueril – ansioso – apático – angustiado – lábil - Ambivalente – maníaco.

h) Pensamento:
Alteração de forma: prolixo, desagregante, bloqueado, tendencioso para uso de neologismos, para desejos de furtar, roubar.
Alteração do curso: taquipsíquico - fuga de ideias –, bradipsíquico.
Alteração de conteúdo: delírio.

i) Linguagens:
Normal, bradifásica, mutista, logorreica, perseverante, neologística, solilóquia.

Saiba Mais
Para aprofundar o conhecimento sobre a realização do exame do estado mental, consultar esta indicação: CORDIOLI, A. V; ZIMMERMANN, H. H; KESSLER, F. Rotina de avaliação do estado mental.

Clique aqui e confira.

O exame psíquico pode contribuir para organizar o raciocínio diagnóstico quando uma pessoa em sofrimento procura uma Unidade de Saúde ou um CAPS. Embora o sofrimento não possa ser reduzido aos sintomas e sinais que a pessoa apresenta, a utilização destes últimos é operacional para nortear o processo de diagnóstico. Os sintomas representam o que a pessoa sente e refere subjetivamente, enquanto os sinais são objetivos, relacionados ao que é perceptível pelo observador. Um agrupamento estável de sinais e sintomas com certa correlação e regularidade e que pode ter diversas causas denomina-se síndrome (DALGALARRONDO, 2008).

Os sintomas com cursos de longa duração geralmente estão associados a dimensões processuais ou do desenvolvimento (JASPERS, 1973). A dimensão processual está relacionada a quadros psicopatológicos onde ocorrem transformações lentas e insidiosas da personalidade cujas causas estão associadas a uma conjunção de variáveis, nem todas possíveis de identificar. Como exemplo de problemas nas dimensões processuais, poderíamos citar os transtornos de personalidade.

A dimensão relacionada ao desenvolvimento refere-se a uma noção evolutiva da configuração da personalidade, onde se convencionam os parâmetros do que seria esperado do funcionamento mental para as diferentes faixas etárias e ciclos de vida. A partir desses parâmetros é realizada a comparação do quadro apresentado por uma pessoa para definir se ela apresentaria algum problema ou não. Essa perspectiva evolutiva é bastante utilizada na abordagem dos problemas de saúde mental da infância e adolescência. Para exemplificar a dimensão relacionada ao desenvolvimento, poderíamos citar o retardo mental e o autismo.

Na intensidade dos sintomas, observa-se a profundidade e a gravidade das manifestações clínicas, as quais costumam relacionar-se ao número de sintomas existentes, à noção que a pessoa tem sobre a existência ou não dos sintomas, e com as situações nas quais a pessoa se expõe ou expõe os outros (SÁ JÚNIOR, 2000).

Saiba Mais
Nesta obra, você encontrará informações relevantes quanto às abordagens iniciais de acolhimento: MINAS GERAIS. Secretaria de Estado de Saúde. Linha Guia - Atenção em Saúde Mental. Marta Elizabeth de Souza (Org.). Belo Horizonte, 2006. 238p.

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Neste estudo você conheceu os fatores que envolvem a contribuição do exame do estado psíquico às síndromes psicossociais. Acompanhou sobre a abordagem na clínica psiquiátrica, bem como a importância do exame do estado psíquico da pessoa em observação.